quarta-feira, 30 de maio de 2012

Meu avô

Hoje de manhã recebi um telefonema da minha mãe.
"Seu avô faleceu", disse ela.
Contou que, logo cedo, meu pai foi até a casa dos meus avós para ver como eles estavam e encontrou meu avô quietinho na sua cadeira, como se estivesse dormindo. Quando percebeu que ele estava frio, ligou correndo para a emergência, mas ele já estava morto. Não sabemos ao certo a hora em que ele se foi, pois estava na sua cadeira desde a hora do seu banho, que era dado por uma técnica de enfermagem todas as manhãs. Morreu em paz, prestes a completar 82 anos de idade, na sua casinha, onde ele tanto amava.

Dois dias após eu voltar para BH, ele se foi.
Foi como se estivesse somente esperando para me ver pela última vez. Estou muito grata por ter ido passar esse final de semana lá e por ter me despedido dele. Nem sei como estaria me sentindo agora se não tivesse tido essa oportunidade.

Ainda estou com uma sensação estranha dentro de mim. Ao mesmo tempo que meu coração está apertado, também está leve. Leve porque eu sei que agora, finalmente, meu avô está em paz. Há 2 anos que a vida dele se transformou num verdadeiro martírio... num verdadeiro sofrimento. Desde que começou a fazer hemodiálise sua saúde só foi se deteriorando, cada vez mais e mais e mais. Nesse final de semana foi sua última internação para tratar as infecções urinárias que ele tinha sempre. Ficou quase 15 dias internado. Estava mal, muito mal... delirando o tempo inteiro... não dormia... gritava de dor. Estava pele e osso. Um homem que um dia foi tão forte, alto, que fez tanto por todos... um homem de coração bom. Esse era o meu avô. Ele mal me reconheceu no hospital, pois estava muito confuso. Mas quando recebeu alta no Domingo, já na sua casa, ele me reconheceu.

Quando o médico lhe deu alta, ficamos preocupados. Ele disse para a minha mãe: "Seu pai não irá melhorar. De agora em diante ele caminhará para a morte." Disse que não havia nada mais para fazer e que talvez, em casa, ele se sentisse melhor. Agora eu entendo e agradeço por esse médico ter lhe dado alta e ter lhe dado a oportunidade de passar seus últimos 2 dias de vida em casa, no seu cantinho, na sua cama.

Na Segunda de manhã fui até lá ver ele e minha avó antes de seguir para o aeroporto e ele me reconheceu, falou meu nome e tudo o mais. Ele ficou me olhando. Fazia muitos anos que ele não via a Paula e ele quase não a reconheceu... fico triste por isso. Ele amava a Paula e sempre perguntava por ela, sei que ele adoraria vê-la novamente, mas não teve a oportunidade de conversar com ela outra vez, pois ele estava tão mal esses dias que mal conseguia falar.

Era quase insuportável vê-lo na situação em que se encontrava. Ele tomava mais de 20 comprimidos por dia, tinha a pele tão fina que só de segurá-lo para tirá-lo da cama era o suficiente para rasgar sua pele. Estava todo machucado. Eu senti um nó imenso na garganta nessa última Sexta-feira, quando o vi no hospital. A última vez que eu o havia visto foi em Janeiro, e ele não estava tão mal quanto agora. Dava pena, gente.

Lembro como se fosse ontem de um dia, quando eu tinha uns 10 anos de idade, que virei para a minha mãe e disse que não conseguia nem pensar no dia em que meu avô morreria, pois só de pensar eu sentia muita tristeza. Lembro da minha mãe me dizendo que eu não deveria pensar naquilo, que deveria aproveitar o tempo ao lado dele e que um dia, no futuro, ele iria partir, como todas as pessoas. Esse dia chegou e eu nunca imaginei o tanto que meu avô iria sofrer antes de partir. Isso sempre me revoltou, pois sempre achei que ele não merecia isso. E como ele sofreu! Só quem viu para ter noção!

Mas o que me deixa tranquila é que eu segui o conselho da minha mãe e aproveitei tudo o que podia aproveitar ao lado dele. Sempre conversei muito com o meu avô, sempre o tratei da melhor forma que podia, com todo o amor que uma neta pode dar! Ele adorava me contar sobre como era sua vida na fazenda, quando ele era menino. Em janeiro desse ano ele me contou muitas coisas, eu passava horas sentada ao lado dele, ouvindo suas histórias. Eu dei comida na boca dele quando ele estava internado, ajudava a trocar suas fraldas, suas roupas, ajudava a virá-lo na cama, ajudava com tudo que estava ao meu alcance. Sempre me senti culpada por não estar lá todos os dias, por morar longe e não poder ajudar a cuidar dele, mas sempre que eu podia viajar para lá eu ia e fazia tudo que estava ao meu alcance. E ele ficava tão feliz quando eu estava lá!

Meu avô sempre chorava quando eu ia me despedir dele e eu precisava engolir forte para não chorar também. Ele dizia que eu era uma neta de ouro. E como isso confortava meu coração! Eu sempre amei muito ele, e fico feliz por saber que ele sentia isso.

Ele se chamava Waldemar e foi filho do segundo casamento da minha bisavó Rosa, que veio da Áustria, e do meu bisavô Carlos, que veio da Itália. Teve (pasmem!) 23 irmãos, passou a infância na fazenda e conta que foi chorando para a cidade, pois não queria abandonar a roça. Casou em 10 de Maio de 1952 com a minha avó. Tiveram um filho em 1953 que faleceu ainda bebê e em 1954 tiveram a minha mãe, Sônia, que acabou sendo sua filha única. Em 1984 teve sua única neta, eu. Uma família pequena para quem cresceu em meio a tantos irmãos!

Foi um homem de coração bom, alto e forte, mas que não tinha coragem de fazer mal a ninguém. Chorão, sempre se emocionava quando íamos nos despedir ou quando íamos cumprimentá-lo em seu aniversário. Trabalhou muito, sempre... se esforçou para pagar a faculdade da minha mãe e ia buscá-la todos os dias no ponto de ônibus à meia noite, quando ela voltava da faculdade, mesmo tendo que acordar às 5h do dia seguinte para trabalhar. Era a ele que minha mãe corria quando era criança e minha avó a colocava de castigo! Sem minha avó saber, ele deixava minha mãe sair escondido do castigo e ir ao cinema! Minha mãe sempre foi muito apegada a ele... meu avô sempre foi um bom pai e um bom avô. Sentava na terra para brincar comigo quando eu era criança. Fazia brinquedos de madeira (meu avô foi marceneiro) e não tinha coragem de brigar comigo quando eu aprontava!

Trabalhou até mais de 70 anos, quando sua saúde começou a piorar e não pôde mais trabalhar fora. Cuidou da minha avó em todas as vezes que ela adoeceu, ajudava minha mãe a dar banho nela, limpava a casa e cozinhava. Ele não tinha preguiça, não tinha má vontade.

Sorria todas as vezes que me via. Quando fecho os olhos lembro dele magrinho, doente, da penúltima vez que nos vimos, sorrindo ao me ver chegar após tantos meses.
E ele passou esses últimos anos totalmente consciente de sua situação. Ele chorava, gente... chorava ao ver sua situação, ao ver como estava dando trabalho para a minha mãe e minha avó. Ele vivia dizendo que queria morrer. Ele estava tão depressivo nos últimos meses que era de cortar o coração.

Quero guardar para sempre no meu coração as lembranças boas que passamos juntos... as conversas, as histórias do passado, a viagem que ele fez para Ouro Preto quando me mudei para lá... ele com saúde, forte, feliz.
Nós fizemos tudo o que estava ao nosso alcance por ele. Minha mãe se desdobrou em mil para lhe dar um pouco mais de conforto nesse fim.

Não sei se existe vida após a morte, mas, se existir, estou certa de que ele está num lugar muito bom.
Mas, independente de qualquer coisa, agora ele está em paz. Sem mais dor... sem mais sofrimento.

Eu te amo, vô! Espero ter conseguido cumprir meu papel de única neta! Espero que você tenha se sentido amado, assim como eu me sentia amada por você.


Minha avó Antônia e meu avô Waldemar, em seu casamento


Meu avô (1º da esquerda) ainda jovem, na sua marcenaria

Meus avós no dia do casamento da minha mãe


Meu avô e eu ainda bebê

Brincando comigo no quintal


Nós adorávamos brincar com esses chapéus!


Meu avô e o irmão dele em 2002, quando foram para Ouro Preto levar minha mudança

Nas bodas de ouro, em Maio de 2002

Já doente, em 2010


Uma das últimas fotos que tiramos dele, na comemoração de aniversário da minha avó, em Setembro de 2011


"Vai sem direção... vai ser livre..."

Vô, essa música é para você... Adeus!
Espero te ver de novo algum dia!


4 comentários:

LOVE MAKES A FAMILY disse...

Meus sinceros sentimentos, Maíra!
Seu avó teve uma linda estrada aqui na terra, mesmo com todo o sofrimento. Eu posso imaginar o quanto foi doloroso para ele, para vocês esses dois anos, mas fiquei pensando que o amor, o verdadeiro amor por nós e pelo outro, só é provado em momentos de grandes complexidades, dores, perdas...Não sei, mas percebi com seu relato, que ele amava tanto a família, que queria proteger de dores fortes, de trabalho. E observei que o amor de sua avó e mãe, foram testados nestes dois anos.
Você é uma privilegiada pro ter tido um avô tão lindo, tão especial, sabia?
Um abraço forte,
A. e R.!

Mamãe Élen disse...

Sei exatamente o que está sentindo, querida. Minha avó faleceu a pouco mais de 1 mês, no dia 22/04. Meus sentimentos...
Beijos!

Adriana ,Sofya e Emanuelle disse...

aai.. chorei!

q lindo ele era!

Anônimo disse...


que seu vozinho esteja bem agora!
Força pra vc, sua mamys e principalmente pra sua avozinha (sua mãe é a cara dela né!!!)
Ah seu vô parece o Sr. Wilson, do Dênis o pimentinha.... adooreeii!!!
bjs

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